quinta-feira, 30 de novembro de 2017

POEMA



Quero escrever-te um poema que
tenha um sentido claro como o
que os teus olhos me disseram.
Poderia ser um poema de amor,
tão breve como o instante em
que me deixaste ver os teus olhos.
Mas o que os olhos dizem não cabe
num poema, nem eu sei como se diz
o amor que só os olhos conhecem.

(Nuno Júdice)

Foto da atriz: Caitriona Balfe  da série, "Outlander"

 

OS AMANTES



As palavras amendoam o sorriso, amado, amada
conversam e conversam, deitados lado a lado
depois, e devagar, maciamente
passam à pele absoluta do silêncio

(Isabel Cristina Pires)

Arte de: Emilia Castañeda - 1943

terça-feira, 24 de outubro de 2017



Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta 
ao pé de uma parede sem porta.


(Álvaro de Campos)

Phtography: Milan Von Brunn



guardou-se no quarto
onde fechava as palavras
e esperou
que ele chegasse
e a libertasse
[como fazia às palavras]


(João Costa)

Photography: Florian Weiler

domingo, 8 de outubro de 2017

EVA


Quando Eva andava nua pelo paraíso,
disfarçava o tédio à sombra das árvores,
colhendo as flores, cheirando o seu perfume,
e pensando como seria bom ter um céu
para espreitar.
Um dia, uma dessas flores transformou-se
em fruto; e Eva levou-o à boca,
trincou-o, provou a sua polpa.
Por um estranho efeito
de causa e consequência, o sabor da maçã
obrigou Eva a cobrir a sua nudez
com folhas e flores, que passaram
a ser uma metáfora do corpo
que escondem.
Então, o pecado tornou-se uma simples
figura de retórica, e o sexo um exercício
de interpretação.

(Nuno Júdice)
Arte de: Anouk Lacasse

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

EU AMEI-TE


Eu amei-te; mesmo, mesmo agora devo confessar,
Algumas brasas desse amor estão ainda a arder;
Mas não deixes que isso te faça sofrer,
Não quero que nada te possa inquietar.
O meu amor por ti era um amor desesperado,
Tímido por vezes, e ciumento por fim.
Tão terna, tão sinceramente te amei,
Que peço a Deus que outro te ame assim.


(Aleksandr Púshkin)- "Poeta Russo, 1799-1837"

O CORPO



Digo do corpo
o corpo
e do meu corpo

digo do corpo
o sítio e os lugares

de feltro os seios
de lâminas os dentes
de seda as coxas
o dorso em seus vagares

Lazeres do corpo
os ombros
as lisuras      o colo alto
a boca retomada

no fim das pernas
a porta da ternura
dentro dos lábios
o fim da madrugada

digo do corpo
o corpo
e do teu corpo

as ancas breves
ao gosto dos abraços

os olhos fundos
e as mãos ardentes
com que me prendes
em súbitos cansaços

Vício de um corpo
o teu
com seu veneno

que bebo e sugo
até ao mais amargo

ao mais cruel grau
do esgotamento
onde em silêncio
nado em cada espasmo

Digo do corpo
o corpo
o nosso corpo

digo do corpo
o gozo
do que faço

Digo do corpo
o uso
dos meus dias

a alegria do corpo
sem disfarce


(Maria Teresa Horta)- in, "As Palavras do Corpo"

terça-feira, 19 de setembro de 2017

SÚPLICA


Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria…
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

(Miguel Torga)

 Photography: Patrick Citera- Modelo, Laura Wallker

SAUDADE


Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono

(Mia Couto)
Photography: Blak White

SE EU PUDESSE... ( o soneto que só errado ficou certo)


Se eu pudesse iluminar por dentro as palavras de todos os dias
para te dizer, com a simplicidade do bater do coração,
que afinal ao pé de ti apenas sinto as mãos mais frias
e esta ternura dos olhos que se dão.
Nem asas, nem estrelas, nem flores sem chão
– mas o desejo de ser a noite que me guias
e baixinho ao bafo da tua respiração
contar-te todas as minhas covardias.
Ao pé de ti não me apetece ser herói
mas abrir-te mais o abismo que me dói
nos cardos deste sol de morte viva.
Ser como sou e ver-te como és:
dois bichos de suor com sombra aos pés.
Complicações de luas e saliva.

José Gomes Ferreira

(Arte de: Rui Carruço)

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

O MEU DESEJO POR TI SÃO LÁGRIMAS POR DENTRO



Olho-te pelo reflexo 
Do vidro 
E o coração da noite 

E o meu desejo de ti 
São lágrimas por dentro, 
Tão doídas e fundas 
Que se não fosse: 

o tempo de viver; 
e a gente em social desencontrado; 
e se tivesse a força; 
e a janela ao meu lado 
fosse alta e oportuna, 

invadia de amor o teu reflexo 
e em estilhaços de vidro 
mergulhava em ti. 




(Ana Luísa Amaral)
Arte  de: Silvia Blanco

UM ROSTO


Apenas
uma coisa inteiramente transparente:
o céu, e por baixo dele a linha obscura do horizonte
nos teus olhos, que pude ver ainda
através de pálpebras semicerradas, pestanas húmidas
da geada matinal, uma névoa de palavras murmuradas
num silêncio de hesitações. Há quanto tempo,
tudo isto? Abro o armário onde o tempo antigo
se enche de bolor e fungos; limpo os papéis,
cartas que talvez nunca tenha lido até ao fim, foto-
grafias cuja cor desaparece, substituindo os corpos
por manchas vagas como aparições; e sinto, eu
próprio, que uma parte da minha vida se apaga
com esses restos.

(Nuno Júdice)
Arte de: Ademaro Bardeli



segunda-feira, 28 de agosto de 2017


Cada um de nós é a linha que vai do que sente ao que faz e que passa
pelo que pensa e diz...somos o que escolhemos sentir, pensar, dizer 
e fazer. Somos querer.


(José Luís Nunes Martins)- in "Amor, Silêncios e Tempestades"

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

O AMOR É MUITO DIFÍCIL


Penso que o amor é muito difícil. Existem muitos obstáculos a que possa ser o absoluto que é. A palavra amor é uma palavra muito gasta, muito usada, e muitas vezes mal usada, e eu quando falo de amor faço-o no sentido absoluto... há uma série de outros sentimentos aos quais também se chama amor e que não o são. No amor é preciso que duas pessoas sejam uma e isso não é fácil de encontrar. E, uma vez encontrado, não é fácil de fazer permanecer.

(José Luís Peixoto) - in 'Notícias Magazine (2003) 

UM MAIS UM


"Reciprocidade: a palavra que causa o efeito mais bonito do mundo."

(Bibiana Benites)

Arte de: Margarita Sikoskaia

SÁBIA DIFERENÇA


"A diferença entre gostar, estar apaixonado e amar... é a mesma diferença entre agora, por enquanto e para sempre."


(Neide)
Arte de: Lauri Blank

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A MENTE É MARAVILHOSA



"A mente é maravilhosa: o que é bem desfrutado, jamais é esquecido."


(Valéria Amado)

Arte de: Olivier Boutin

sexta-feira, 28 de julho de 2017

PERNOITAS EM MIM


Pernoitas em mim
e se por acaso te toco a memória… amas
ou finges morrer
...
pressinto o aroma luminoso dos fogos
escuto o rumor da terra molhada
a fala queimada das estrelas
é noite ainda
o corpo ausente instala-se vagarosamente
envelheço com a nómada solidão das aves
já não possuo a brancura oculta das palavras
e nenhum lume irrompe para beberes


(Al Berto)- in "Rumor dos Fogos"
11 de Janeiro de 1948 — 13 de Junho de 1997
Arte de: Katya Gridneva

segunda-feira, 24 de julho de 2017


Ela entrou no meu pé com o pé dela
e entrou na minha cintura com a neve dela.

(Leonard Cohen)

sexta-feira, 21 de julho de 2017


Todo o mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente.
( William Shakespeare)

Escultura de: Moises Hergueta


A ausência cura o amor

(Miguel de Cervantes)

Arte de: Christopher Gallego, 2006


A saudade é o que faz as coisas pararem no tempo

(Mario Quintana)
Arte de: Karen Hollingsworth,


NÃO ME LEMBRO / MAS SEI


Não me lembro se chegaste a pedir para entrar nos meus dias. Mas que importa, apetece-me afundar no teu olhar e perder-me num momento que não termine nunca. Só eu sei como a voz dos teus olhos tem mais timbre que o som das gotas de orvalho… e elas caem nesta madrugada vindas do cimo de todas as flores. Enraizaste-te em mim como a neblina ao beijar a terra por cima do monte… intensamente… e os corpos evadem-se nessa bruma densa… toco-te… tocas-me a alma com esse sabor selvagem de quem está presente mesmo quando ausente… és mulher!


(Francisco Valverde Arsénio)

Phtography: 
 Elena Resina

quinta-feira, 20 de julho de 2017

O QUASE


Ainda pior que a convicção do não, e a incerteza do talvez, é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi. Quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu ainda está vivo, quem quase amou não amou.
Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas ideias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor, não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distancia e frieza dos sorrisos na frouxidão dos abraços, na indiferença do “Bom Dia” quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até para ser feliz.

A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma,  apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.
Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência, porém, preferir a derrota prévia à duvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.


Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu. 


(Luiz Fernando Veríssimo )
(Apócrifo)
Arte de: Mariana Kalacheva

PRECE


Dá-me a lucidez das correntezas
para que eu descubra
entre as tristezas que se
avolumam algum
sorriso mesmo
que não seja para mim.

Dá-me a serenidade de uma
estrela para que eu imagine
entre as lágrimas que não
me deixam qualquer
paz ainda que breve.

Dá-me a claridade das
luas cheias para que eu invente
entre as angústias
que se esparramam um
horizonte mesmo
que se transmutem em ilusão.

Dá-me a esperança das
árvores para que eu teça
entre as ausências que se
intensificam uma sanidade
ainda que estofada de delírio


(Adair Carvalhais Júnior)
Photography: Natalia Drepina

O QUE EU QUERO


Não tenho paciência para ouvir os outros, não tenho paciência para viver,
 não tenho paciência para morrer, estou aqui, parada, num desequilíbrio interminável, 
nunca mais acabo de cair, irrito-me se me falam, sofro se me não dizem nada,
 odeio o gesto caridoso: a mão de alguém nos meus cabelos, 
o que eu quero é uma voz que me queira, 
 um momento de descanso nessa voz. 


Rui Nunes
Arte de: David Graux



É já tempo de não esperar ninguém. 
Passa o amor, fugaz e silencioso 
como ao longe um comboio noturno
 Não resta ninguém, é hora 
de voltar ao desolado reino do absurdo, 
a sentir culpa, ao vulgar medo
 de perder o que já estava perdido.
 À inútil e sórdida moral.
 É já hora de dar por vencido no trabalho,
 a sós, outro Inverno. 
Quantos faltam ainda, e que sentido
 tem esta vida onde te procurei, 
se chegou já a hora tão temida
 de comprovar que nunca exististe? 


(Joan Margarit)-tradução de Vasco Gato)

Photography: Paulo Laureano

quarta-feira, 12 de julho de 2017


Meu coração ainda se atreve a desejar, e minha vontade ainda ousa uma esperança.

(Tristão e Isolda])- Filme

Photography: Jo Alison Feiler


Como se o Amor
tivesse início na promessa
dos teus olhos
do teu corpo...
.
...
E a inventada primavera,
nos teus beijos,
fizesse propagar sol
e calor...
.
Assim é o Paraíso dos
sentidos, que
se deixa aprisionar na tua voz,
e o encantamento
dos sorrisos
que moram no meu peito à tua espera...
.

(Margarida Afonso Henriques)

Photography: Nishe


Por vezes
Gostaria de me desvestir
De mim

Jogar para longe
...

A pele
Que me tolhe
A alma


(Milem Ésoj 05.12.2014)

Photography: Anka Zuravleva


Onde estão as palavras?
Por que elas se despediram prematuramente de mim?
Silenciaram, por medo?
Quero poder ouvi-las novamente. Quero poder senti-las uma vez ainda.
Estou aqui. Permanecerei aqui, à espera do seu retorno, nesta mesma morada, onde um dia a minha imaginação também encontrou abrigo e proteção.

(Alexandre Rubenich)


Se eu correr, me acompanhe. Se eu esmorecer me apoie. Se eu tentar desistir, não me deixe.
Se a alegria me faltar em alguns momentos, faça riso. Se eu tiver dúvidas me dê razões para eu confiar. Sobretudo se eu disser, preciso de ti, fique, porque é de ti que eu realmente preciso.

(Ita Portugal)
Photography: Christer Strömholm - Paris, 1960


E se imagina, é porque tem vontade..


Que todos os toques sejam de amor!
Que as mão se entrelacem,
que não causem dor!!!

São tão preciosas as mãos...

(Marilne)

SAUDADE


Hoje estou com saudade de tudo, de todos.

Até de mim...

(Nivaldete Ferreira)


NESTE MEU SILÊNCIO...


Neste meu silêncio que é só meu
busco um céu aberto fulgurado de estrelas…
...
Busco um renascer num voo branco,
onde eu possa atravessar as nuvens,
me adornar com sorrisos claros
e regressar vestida de luz.

(Arnalda Rabelo)


quarta-feira, 31 de maio de 2017

NO UNIVERSO DOS SENTIDOS


Não sei dizer-te muita coisa…
sinto que há palavras que me tombam quando chegam à boca
como se a morte me espreitasse, como um destino inexorável
do qual não pudesse regressar
por isso as engulo sem saliva
ficando no silêncio mudo do meu corpo
esperando-te.
Outras fogem-me aos soluços como um lamento ou uma alegria breve
tão breve como a palavra
tão sentida como um beijo, uma caricia
aí desfaz-se a mudez e, por instantes, abre-se o sorriso
ao mundo.
Depois ainda as outras que me mantêm cativa…
essas escorregam-me pelo corpo como uma flor que se desfolha
quantas vezes consentida corola desnuda
perpetuando a nudez pelo universo do quarto
em crescente…
Não sei dizer-te muita coisa
Na verdade, não sei se alguma vez te soube dizer alguma coisa em palavras
Ou se apenas as sentiste.

(Teresa Brinco de Oliveira)

PENSAMENTO


ontem à noite
sonhei de corpo inteiro
-acordei com teu cheiro

(Alonso Alvarez)