terça-feira, 21 de agosto de 2018


com passos de nevoeiro saíste de mim e disseste
agora vou morrer noutro corpo
para que nunca mais tenha na minha pele o pânico
das madrugadas que me levavam ao remorso
de acordar no mais fundo de ti

saíste com passos de nevoeiro
e disseste desculpa ser assim
e eu nem respondi porque sabia
que não eras tu que desaparecias mas apenas
o que em teu nome um dia tinha vindo
para que eu não morresse tão longe do lugar do amor

(Alice Vieira)- Poema do livro "Dois Corpos Tombando na água"

Fotografia de: Black White


Não tardará a chegar ao fim
 este agosto que te viu passar 
 com a luz a teus pés. 
 Somos eternos, dizias.
 Eu pensava antes na danação da alma
 ao faltar-lhe o alimento que lhe trazias.
 Agora a cidade
 vive do peso incomensuravelmente morto
 dos dias sem a tua presença. 
 Deixo a mão correr sobre o papel 
 tentanto captar o eco de uma palavra, um sinal, 
 e quem em qualquer parte cintila,
 e confia ao vento o segredo da nossa tão precária eternidade.

(Eugénio de Andrade)

Arte de: karen Hollingsworth