terça-feira, 19 de setembro de 2017

SAUDADE


Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono

(Mia Couto)
Photography: Blak White

3 comentários:

  1. Rosinha, minha amiga!

    Uma maneira diferente de falar de saudade e desejo de volta, mas Mia Couto tem uma forma muito sui generis de o fazer.
    Um pedido, que deve ser ouvido e atendido!

    Beijos e boa semana.

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  2. Quero dizer-lhe que todas as imagens, que escolheu para encimar os poemas são de mto bom gosto. Parabéns!

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    Respostas
    1. Amiga, Céu!

      Adoro os poemas de Mia Couto, gostaria de me identificar com eles, mas neste momento sinto-me vazia, publico-os porque gosto, mas porque haverá alguém a quem, dirá mais do que a mim. Não tenho a quem os dedicar, nem tão pouco tenho (neste momento) quem me faça sofrer de amor.. VAZIO TOTAL!

      Obrigada por gostar das imagens, tenho milhares, é só perder um pouco de tempo e conjugar texto e imagem. Tenho essa preocupação, sim.

      Uma boa semana para si. Beijinhos.

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