terça-feira, 5 de abril de 2016

UM OUTRO TANTO


Não sei como consigo

amar-te tanto
...

se querer-te assim na minha fantasia

é amar-te em mim

e não saber já quando

de querer-te mais eu vou morrer um dia

perseguir a paixão até ao fim é pouco

exijo tudo até perder-me

enquanto, e de um jeito tal que desconhecia

poder amar-te ainda

um outro tanto

(Maria Teresa Horta)

Photography: Mira Nedyalkova

UM HOMEM E UMA MULHER ENTRE QUATRO PAREDES


Assim que um homem e uma mulher de quase qualquer idade estão juntos sozinhos, dentro de quatro paredes, assume-se que então qualquer coisa pode acontecer. Combustão espontânea, fornicação imediata, triunfo dos sentidos. Que possibilidades os homens e as mulheres têm que ver um no outro para inferir tais perigos. Ou, acreditando nos perigos, com que frequência eles precisam de pensar sobre as possibilidades. 

(Alice Munro)- entrevista



Lembra-te que quando um homem sai do quarto, deixa lá tudo o que aconteceu... e quando é uma mulher a sair, leva tudo com ela. 

(Alice Munro)

DAVA A VIDA PARA TE APERTAR CONTRA O MEU PEITO


Nunca te vira tão linda e sedutora ao mesmo tempo como ontem à noite. Dava a vida para te apertar contra o meu peito. Diz-me, era o amor que eu te inspiro que te fazia assim tão bela? Seria a paixão que me abrasa que te tornava tão atraente a meus olhos? Bem viste: não podia deixar de olhar para ti, nem de beijar a candeiazinha de oiro. Quanto tu saí...ste tive vontade de me prosternar a teus pés e de te adorar como a uma divindade. Ah! Se tu me quisesses metade do que eu te quero! Deste volta à minha pobre cabeça; repara no mal que me fizeste querendo-me como me queres. Às oito, esperar-te-ei numa ansiedade. 

(François Chateaubriand)- in ' Carta à Condessa de Castellane (1823)


Na tua vida existem alguns lugares, ou talvez apenas aquele lugar, onde alguma coisa aconteceu, e aí estão todos os outros lugares. 

(Alice Munro)

Porto- Portugal


"Teus olhos insistem em me chamar para essa eterna dança de olhares... Eu só espero que a música não pare..."

(Desconheço o autor)

DÁ-ME UM LIVRO


Dá-me um livro de páginas por descobrir, mesmo que nelas meus dedos já tenham passeado.
dá-me um livro onde as noites se escrevam como rios fluindo por entre florestas de metáforas.
dá-me um livro onde as línguas se misturem sem nação, ou boca, códigos enfeitiçados na suspensão de lábios alvoraçados.
...
dá-me um livro para nele eu entrar. pode ser prosa, pode ser poesia, pode ser o teu corpo.

(João Costa)- 29 Fevereiro 2016


PORQUÊ CAMUFLAR AS NOSSAS CONVICÇÕES?



Desde que nos propomos emitir uma verdade de acordo com as nossas convicções damos logo a impressão de fazer retórica. Que espécie de prestidigitação vem a ser essa? Como é que nos nossos dias não poucas verdades, proferidas que sejam, por vezes, mesmo em tom patético, imediatamente ganham aspectos retóricos? Porquê é que na nossa época cada vez há mais neces...sidade, quando pretendemos dizer a verdade, de recorrer ao humor, à ironia, à sátira? Porquê adoçar a verdade como se se tratasse de uma pílula amarga? Porquê envolver as nossas convicções num misto de altiva indiferença, digamos, de desprezo para com o público? Numa palavra, porquê certo ar de pícara condescendência? Em nossa opinião, o homem de bem não tem de envergonhar-se das suas convicções, ainda mesmo que estas transpareçam sob a forma retórica, sobretudo se está certo delas. 

(Fiodor Dostoievski) in "Diário de um Escritor"

A DESGRAÇA DO SONHADOR


E vocês sabem o que é um sonhador, cavalheiros? É um pecado personificado, uma tragédia misteriosa, escura e selvagem, com todos os seus horrores frenéticos, catástrofes, devaneios e fins infelizes... um sonhador é sempre um tipo difícil de pessoa porque ele é enormemente imprevisível: umas vezes muito alegre, às vezes muito triste, às vezes rude, noutras muito compreensivo e enternecedor, num momento um egoísta e noutro capaz dos mais honoráveis sentimentos... não é uma vida assim uma tragédia? Não é isto um pecado, um horror? Não é uma caricatura? E não somos todos mais ou menos sonhadores? 

(Fiodor Dostoievski)- in "Escritos Ocasionais"


Há dias em que a estrada é linda
E os passos não se contam
Há dias em que nos sentimos longe
Na serena luz que finda
Sem gente nem flores
...

Ninguém nos vê mas estamos
Somos
Ficamos
Na cor de um outro olhar

(Edgardo Xavier)
Phtography: Kharlamov


A VIDA NUMA CORDA BAMBA



Costumo dizer que quando estamos muito tristes, com a alma triste até a morte, é como se estivéssemos atravessando um desfiladeiro em uma corda bamba. O que tem em baixo é um Abismo, e o que está acima é o Céu. Se você olhar pra baixo, você verá o Abismo.
O Abismo atrai o olhar, mas o Abismo é morte certa, e ao olhar para ele você pode entontecer e cair. Portanto, nunca olhe...
para o Abismo. Mas também não olhe para o Céu. O Céu é como um sonho, e ele pode estar belíssimo, muito azul, com um Sol radiante ou repleto de estrelas, não importa: não olhe para o Céu, porque de tão belo ele pode fazer você esquecer de que precisa manter o equilíbrio e seus pés bem firmes na corda.
Desta forma, eu te digo: o único lugar para o qual você deve olhar é para a frente, onde está o Horizonte. O Horizonte é onde está tudo o que você pode descobrir, viver e alcançar. Basta seguir em frente.
Se você olhar para trás, poderá ver teus familiares e amigos dizendo “siga em frente”. Mas se não puderes ouvir isto, concentre-se em teus pensamentos, por que é na verdade o que você quer: Seguir em frente! Então apenas mire o horizonte, mantenha teus passos bem firmes e você atravessará o desfiladeiro, onde do outro lado haverá um mundo, pessoas e uma vida que esperam, sinceramente, que você siga em frente.

(Augusto Branco)



Quem finge que ama
Um dia encontrará alguém que fingirá que acredita...

(Oscar de Jesus Klemz)

ECOS DE BRAMIDOS


Lá longe se esconde o sol
Num poente deslumbrante
E os meus olhos dolentes
...
Esperam um dia crescente
Num horizonte bem distante
Todos os dias têm a sua luz
Como o sol tem o seu poente
Todo o amor tem a sua cruz
Leito de rio, água fluida
Na fraga de fogosa nascente
Na marcha lenta diurna
Todos os sóis têm seu poente
Na foz se afundam as águas
Na fraga brota a nascente
Neste ciclo alucinante
Caminhamos tão distraídos
Levados por ecos… perdidos

(Zimbro)

Imagem: Pixabay

Às vezes acontece que nos encontremos onde não esperávamos; que guardemos dentro quem não nos esperava; que nos descubramos onde nunca nos lembramos de ter ido. Mas a vida, parecendo ser de acasos, é de encontros, ou de reencontros... e por isso, o que acontece, é que enquanto julgamos que vivemos, andamos afinal à nossa procura...


(Emílio Gouveia Miranda)
«onde não te puderem amar

não te demores»


(Desconheço o autor da frase)

E a espera é não acontecer
E a saudade é tudo ser igual.
...

(Daniel Faria)
Photography: Alexandra Kirievskaya