sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

A UM PASSO DO AMOR



A um passo do amor estarás a um passo do futuro e a duzentos mil anos do passado. O teu nome é o nome de todas as coisas-, quando todas as coisas respiram no teu nome. Entre o sofrimento e a felicidade, muito de ti se espalha pela vida, muita vida te aguarda, muita vida te procura. Um duplo coração bate dentro do peito e fora de ti. Tens a sabedoria das crianças e a sabedoria d...os velhos. Sabes ferir e beijar e sentes o vento do orgulho. Pequeninos gestos, grandes pensamentos, constroem um dia excepcional, um amor excepcional, uma violência excepcional. Todas as noites são uma só noite, tanto desespero pode voltar a ser esperança. As tuas mãos são uma pátria. Os teus dedos são, umas vezes, o mais difícil dos rebanhos. E outras, os cães que o guardam, quando a verdade é triste e o amor tem a fome e a sede das estrelas. 

(Joaquim Pessoa)- in 'Ano Comum'


"mais ousadia e menos consciência. a consciência é a gaiola que nos aprisiona os sentidos e condiciona o acto de criar algo, e quem não ousa habita uma frustração ilimitada."

(Luísa Demétrio Raposo)

Foto de: Jaroslav - Vasiliev

EXPLICAÇÃO DA ETERNIDADE



devagar, o tempo transforma tudo em tempo. 
o ódio transforma-se em tempo, o amor 
transforma-se em tempo, a dor transforma-se ...
em tempo. 

os assuntos que julgámos mais profundos, 
mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis, 
transformam-se devagar em tempo. 

por si só, o tempo não é nada. 
a idade de nada é nada. 
a eternidade não existe. 
no entanto, a eternidade existe. 

os instantes dos teus olhos parados sobre mim eram eternos. 
os instantes do teu sorriso eram eternos. 
os instantes do teu corpo de luz eram eternos. 

foste eterna até ao fim. 

(José Luís Peixoto) - in "A Casa, A Escuridão"


Encontro-me e desencontro-me, sem nunca ter fugido
de mim, nem ter-me procurado...

(José Gabriel Duarte) -in As Cores do Desejo : Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014

NEM SEI SE SOU



Nem sei 
se algum dia
virei a saber quem sou...
ou como sou
ou como esse alguém
eu pareço ser

Nem sei mesmo
se deverei saber
se me devo perguntar
ou ter de responder

Porque nem mesmo
sei se sou...

(José Gabriel Duarte) - in As Cores do Desejo : Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014

(...)
Ainda não sei bem mas parece que renasci nestes dias vagos. Não. Não morri nas noites inventadas do nada e não me sentei numa nuvem qualquer ou dei pontapés na lua.

Recordo que me pediste um sonho onde não houvesse estrelas. E também uma estação do ano despida de nadas em que o cinzento do fim do dia entrasse pela porta, errante e vagamente absorto, onde o vento seguisse pela rota traçada ...no sono… invisível… tétrico… rasgado. Recordo que me pediste que me preocupasse apenas com as linhas do teu rosto.

Sim. Renasci nestes dias fora de gestos. Lavei palavras manchadas. Expurguei outras e diluí-me no sulco da minha essência. Ah! É verdade…. recordo que me pediste um sonho onde não houvesse estrelas.
(...) 

(© francisco valverde arsénio)

Foto de: Donna Blackchall


E, aquele 
Que não morou nunca em seus próprios abismos
Nem andou em promiscuidade com os seus fantasmas
Não foi marcado. Não será exposto
Às fraquezas, ao desalento, ao amor, ao poema.

(Manoel de Barros)


Desconheço o autor da pintura

CORPOS



Teu corpo é arco
na ponta dos meus dedos
três leves polpas...
na flor da minha mão
com que inflamo a manhã
no teu ventre.

mergulhado
nos teus braços
envolto em lábios,
em perfume.

em beijos,
na água do teu pescoço
brando de rosas
nos picos doces
no peito leve.

Quando somos amor
nossos corpos são arcos

(José Jorge Frade)

Arte de: Stephen Mitchell - 2010

DE MÃOS DADAS COM A NOITE



Hoje não me apetece dormir!
Depois da chuva e pela calada da noite
sentei-te bem junto a mim,...
escrevi a tua morada no meu peito
e numa conversa surda de sentimentos frios
pelos caminhos incertos, tão nossos,
procurei na noite o som da tua voz.
Mas não dissemos nada!
Nem os segredos de quem somos...

Hoje não me apetece dormir!
Soprei-me então por entre as vagas soltas
para dentro do vazio do teu abraço.
E caminhei assim de mãos dadas com a noite.

(António Carlos Duarte)- in da Geometria do Amor

Arte de: Dorina Costras


Haverá momentos, que por nos parecerem tão breves
se tornam eternos...

(José Gabriel Duarte)- in As Cores do Desejo: Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014

ERAM DOIS



Eram dois
dois corpos entrelaçados
que se amavam...

Eram como fios de luz
que se cruzavam

Eram como fios de vida
que se atavam

Eram dois
dois seres
que se libertavam

Porque tudo o que dantes
entre os dois
eram sombras
fronteiras e barreiras

Naquele instante
e os dois
eram sombras
fronteiras e barreiras

Naquele instante


os dois fogosamente
dentro e fora deles
atravessavam...

(José Gabriel Duarte)- in As Cores do Desejo: Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014


Gosto de adivinhar o teu corpo, sempre que o escondes no meu...

(José Gabriel Duarte)- in As Cores do Desejo: Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014

O TEU CORPO


O teu corpo
É o meu recanto
É onde sonho
Onde descanso...


Mas é também
Por onde corro
Por onde respiro
Onde não me canso.

 (José Gabriel Duarte)-in As Cores do Desejo: Poemas improváveis

Editora, Versbrava 2014

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015


Por vezes perco-me, mas não me procuro,
sei que depressa voltarei a encontrar-me...
 
(José Gabriel Duarte) -in As Cores do Desejo : Poemas improváveis
 
Editora, Versbrava 2014

A MULHER MAIS BONITA DO MUNDO


estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram
flores novas na terra do jardim, quero dizer
que estás bonita.
...

entro na casa, entro no quarto, abro o armário,
abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio
de ouro.

entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como
se tocasse a pele do teu pescoço.

há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim.

estás tão bonita hoje.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

estás dentro de algo que está dentro de todas as
coisas, a minha voz nomeia-te para descrever
a beleza.

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

de encontro ao silêncio, dentro do mundo,
estás tão bonita é aquilo que quero dizer.

(José Luís Peixoto) - in "A Casa, a Escuridão

OS TEUS OLHOS


trazem o mar até à minha porta
e à memória cruzada
de um tempo, outro, entre o riso e a espada.
Entre a espera e a esperada....

Nos teus olhos
flutua o instante que se ganha, que se perde
e que o tempo suspende, suporta
e atrasa,
que se espraia num mar entre o azul e o verde
e em cada manhã chega à minha porta
e entra resplandecente e manso, pela casa.

 (Miguel Afonso Andersen) - em "O início das águas"
 
Arte de: Godfred Yarek