quinta-feira, 26 de março de 2015

QUEM TERÁ FICADO COM O RESTO DO MEU SONHO?


Hoje, vou dançar com o meu sonho. Saltei o muro da realidade e agarrei as imagens ainda vibrantes de um filme do qual foi a protagonista por benevolência, talvez, doutros desígnios mais poderosos que nos movimentam o coração que bate num ritmo que me faz lembrar o teu nome. Foi um sonho auspicioso, daqueles que nos recordam a falta que nos faz ser abraçadas todos os dias, numa entrega saudável sem cobranças, sem atropelos, numa transparência humana que engrandece e acalma. O sonho decorria fora do meu controlo; não o pensei, não o escrevi, não li o argumento, ninguém me pediu opinião. Limitei-me a encostar a cabeça na almofada macia, aninhar-me nos lençóis -como me preparasse para nascer- e entrar na esfera dos adormecidos como feiticeira da noite. Nada mais do que isto. Até tu apareceres!
 
 
 Sem aviso. Sem perguntas. Sem voz. Sem gestos. Sem palavras. Nem poderia afirmar que eras tu se não fosse olhar as tuas costas, sentir a força dos teus braços e o calor do teu corpo e quando, por certo era a exigência do realizador, senti que os teus lábios se aproximavam, lembro-me de tocar nos teus ombros (lindos) com os dedos como se dedilhasse as teclas de um piano e murmurar: não está certo, isto não está certo. E acordei-me! Sem culpas mas com penas, e levei o resto da noite a imaginar que, afinal, é uma forma de viver, quem me teria escolhido, na esfera do sono, para desvendar o que eu própria desconheço? Como terias tu descoberto os caminhos dos meus sonhos se eu nem sei onde moras! Já não se dorme como antigamente, as noites são povoadas de montanhas russas em apoteoses fingidas que nos tornam poderosas nas emoções desmesuradas, como tesouros guardados nas mãos que juntamos como se ensaiássemos uma saudação oriental. Gentil e harmoniosa. Mas, quem terá, afinal, ficado com o resto do meu sonho?
 
 
(Maria Elvira Bento)

Arte de: Renata Brzozwka

Sem comentários:

Enviar um comentário