quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

NO PRÍNCIPIO ERA


Não dormia sem o escuro absoluto.
Doíam-lhe os olhos de ter visto cidades,
de ter esquecido gente, do frio
do vidro nas palavras. Demorava tanto
a entender o mundo que agora não dormia
de muita luz que as coisas tinham
antes sequer de serem suas. Trabalhava-se tanto
nesse lugar onde vivia com outros como ela
que às vezes pensava: tão estranho nascer
(quer dizer, nascer mesmo, estar aqui)
para o dia passado com estranhos.
E por isso, no princípio, não dormia
sem procurar o amor, sem beijar na testa
a noite que acabava serena e exausta como a noite.
No princípio era.
Depois esvaziou-se com cuidado.

1 comentário:

  1. Obrigado por me seguires, ainda que com outro perfil... mesmo assim consegui chegar até aqui e ver a excelente poesia que foste escolhendo ao longo do tempo (mas não vi nada escrito por ti...).
    Rosinha, tem um bom fim de semana.
    Beijo.

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