sábado, 3 de agosto de 2013

TENTO EMPURRAR-TE DE CIMA DO POEMA


Tento empurrar-te de cima do poema
para não o estragar na emoção de ti:
olhos semi-cerrados, em precauções de tempo
...
a sonhá-lo de longe, todo livre sem ti.

Dele ausento os teus olhos, sorriso, boca, olhar:
tudo coisas de ti, mas coisas de partir...
E o meu alarme nasce: e se morreste aí,
no meio de chão sem texto que é ausente de ti?

E se já não respiras? Se eu não te vejo mais
por te querer empurrar, lírica de emoção?
E o meu pânico cresce: se tu não estiveres lá?
E se tu não estiveres onde o poema está?

Faço eroticamente respiração contigo:
primeiro um advérbio, depois um adjectivo,
depois um verso todo em emoção e juras.
E termino contigo em cima do poema,
presente indicativo, artigos às escuras.


(Ana Luísa Amaral)
«Coisas de Partir», Coimbra,
Fora do Texto, 1993

O meu desejo!!!


REFLEXOS


 Olho-te pelo reflexo
Do vidro
E o coração da noite

...


E o meu desejo de ti
São lágrimas por dentro,
Tão doídas e fundas
Que se não fosse:



 o tempo de viver;                        
                           e a gente em social desencontrado;
e se tivesse a força;
e a janela ao meu lado
fosse alta e oportuna,



invadia de amor o teu reflexo
e em estilhaços de vidro
mergulhava em ti.

(Ana Luísa Amaral)



Não vou pôr-te flores de laranjeira no cabelo


...
Não vou pôr-te flores de laranjeira no cabelo

nem fazer explodir a madrugada nos teus olhos.


Eu quero apenas amar-te lentamente

como se todo o tempo fosse nosso

como se todo o tempo fosse pouco

como se nem sequer houvesse tempo.


Soltar os teus seios.

Despir as tuas ancas.

Apunhalar de amor o teu ventre
 
(Joaquim Pessoa)

Molhei os lábios no dulcíssimo néctar da Felicidade
Floriram-me nos lábios rosas vermelhas
Beijos como pétalas de fogo,
Chamas de aromas inebriantes e desconhecidos.
Aceitei o meu Destino e abri-Te o meu coração.
...
Logro amargo!
Destino de embuste!
Oceanos de enganos!
És o olhar do medo, a palavra cobarde, o espelho da mentira.
Trago-Te, hoje, tão presente no meu coração, como ontem.
Deste-me instantes atiçados no desejo do amar sem regresso
E fugiste sem partir.
Ressoam os gemidos do Teu arrependimento
Os passos que arrastas na desolação da perda de mim.
Não fui eu que Te dei o medo
Nasceste do verbo cansado e resignado às migalhas do existir.
Eu sou Vida que não se cansa e que não se gasta
Eu sou a que rasga os espartilhos do dever ser, para ser infinita.
Por medo de sofrer, não conheceste a essência do Viver.
Amaldiçoas agora a fraqueza dos passos que esbanjaste no egoísmo de Ti,
Mendigas o Amor que perdeste,
E pedes mais tempo ao tempo e o tempo faz troça de Ti.
Agonizas... e o meu coração dilacerado fecha-se como um punho.
Estendo-Te a mão, mas é tarde, é tarde demais.
Olho-Te,
Chamo-Te,
Tudo em vão.
Ela veio buscar-te apressada.
O Teu corpo inerte,
Os teus olhos fixos no Amor desertado
Já não podem humedecer com as lágrimas a aridez do Teu coração.

(Vera Peneda)

O BEIJO MATA O DESEJO


 MOTE

«Não te beijo e tenho ensejo
...
Para um beijo te roubar;
O beijo mata o desejo
E eu quero-te desejar.»

GLOSAS
Porque te amo de verdade,
'stou louco por dar-te um beijo,
Mas contra a tua vontade
Não te beijo e tenho ensejo.

Sabendo que deves ter
Milhões deles p'ra me dar,
Teria que enlouquecer
Para um beijo te roubar.

E como em teus lábios puros,
Guardas tudo quanto almejo,
Doutros desejos futuros
O beijo mata o desejo.

Roubando um, mil te daria;
O que não posso é jurar
Que não te aborreceria,
E eu quero-te desejar!

(António Aleixo)


Prazer e Êxtase...